quinta-feira, 9 de junho de 2011

ENTREVISTA MINEIRINHO

Mineirinho: "Se perder sorrio, mas no quarto vou chorar"

Adriano de Souza, o “Mineirinho”, fala sobre a origem humilde e sua trajetória até o primeiro lugar no ranking do mundial de surfe

Fotos George Magaraia


“Eu era o último a ser escolhido na escola na hora do futebol". A frase é de Adriano de Souza, de 24 anos, mais conhecido como “Mineirinho”, o craque das ondas que entrou para a história após vencer a última etapa do World Tour no Rio de Janeiro e se tornar o primeiro brasileiro a liderar o ranking mundial do surfe.

Se no futebol ele ficava em último no mar a história é diferente. Aos 8 anos, Adriano, nascido e criado em uma comunidade pobre no Guarujá, em São Paulo, saia escondido de casa para seguir o único irmão, Ângelo, hoje com 36 anos, até a praia. “Na época nem sabia o que estava fazendo. O via surfar e queria ir também”, lembra ele, que sempre teve o irmão como exemplo. “O Ângelo me deu a minha primeira prancha e o apelido de ‘mineirinho’ pelo meu jeito caladão. Se eu não fosse surfista teria me tornado militar como ele”.

A mãe, dona de casa, e o pai, que trabalhava no porto de Santos, não poderiam imaginar que, aos 10 anos, o filho caçula enveredaria por um caminho completamente diferente do resto da família. “A Oakley começou a me patrocinar nessa época depois que o Pinga (Luis Henrique Campos, empresário de Adriano) me viu surfar e fez a ponte contactando várias empresas”, diz o surfista, que aos 15 anos já era promessa nacional e aos 18 conquistou o Mundial Júnior na Austrália.

Apesar do sucesso, Adriano diz estar vivendo um dia de cada vez: “Ainda não assimilei”. Há três anos ele vive em Dana Point, no sul da Califórnia, afastado das preocupações do dia a dia para se dedicar exclusivamente ao surfe. As regalias são bancadas, evidentemente, pelos patrocinadores. “Eles dão tudo que envolva a estrutura do esporte em relação a salário, bônus, viagens, o lugar onde moro, o que preciso para treinar. É tudo pago por eles”, enumera o paulista, que produziu ano passado seu primeiro curta-metragem, o “Day by Day”, mostrando sua rotina. “Você pode baixar na internet. Adoro internet. É o meu hobby. Posto tudo que faço nas minhas páginas e a galera curte para caramba. Na minha opinião internet é o futuro”.

Veja o vídeo da vitória de Mineirinho no WT Rio 2011.

Leia o papo exclusivo com o campeão que desbancou Kelly Slater do mundial de surf:

iG: O que representa para você ser o primeiro brasileiro a ficar no topo do ranking mundial?
Adriano de Souza:
O Brasil merece. Tivemos grandes estrelas que não tiveram muita estrutura e sorte no circuito como o caso do Fábio Gouveia. Sei que é cedo para falar, mas estar em primeiro lugar é um bom gostinho. Dormir em primeiro lugar... Ainda estou assimilando.

iG: Qual a sensação de vencer em casa?
Adriano de Souza:
A melhor sensação do mundo. Quem sabe vou me estruturando e sai um título nos próximos anos? Desde 2009 que não gritava “campeão”. Foram dois anos de muita luta. Cheguei tantas vezes próximo... Estava engasgado.

iG: Como foi ter batido Kelly Slater?
Adriano de Souza:
A gente entra no mar para ser o melhor não importa quem esteja lá. Ganhar dele é algo que te motiva o tempo inteiro, mas ele é o patamar mais alto que a gente tem. Graças a ele muitas famílias que nunca souberam o que é surfe hoje sabem. Conhecem pelo menos quem é Kelly Slater.



iG: Você é muito competitivo?
Adriano de Souza:
Sou. Em todos os aspectos. Se for jogar ping pong agora vou jogar sério, como se fosse um mundial. Não é para brincar (risos).

iG: E quando perde?
Adriano de Souza:
Não encaro como brincadeira. Se perder na hora sorrio, mas, no quarto, vou chorar.

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iG: Você veio de uma comunidade de classe baixa e conseguiu chegar no topo.
Adriano de Souza:
Sou do Guarujá, nasci e cresci numa comunidade pobre chamada Santo Antônio. Meu irmão, Ângelo, é militar há mais de 15 anos. Ele sempre foi o exemplo da família. Dentro de casa eu tinha um tratamento militar, de acordar cedo e dormir cedo. Então sempre fui regrado graças a ele. Foi difícil... Sempre é difícil. Porque a minha família não veio de uma situação das melhores. Mas nasci numa comunidade onde fiz grandes amigos e tive uma infância alegre. Acho que tudo isso me deu uma base que me dá retorno até hoje.

iG: Quando seus pais souberam que queria ser surfista o que acharam?
Adriano de Souza:
Meus pais não sabem até hoje o que está acontecendo. São super desligados, vivem um mundo do dia-a-dia, na deles, bem zen. Só o meu irmão é que é mais ligado. Por exemplo, na casa dos meus pais hoje não tem internet e nem televisão. Eles assistem TV raramente. É praticamente uma família hippie. Eu acho isso o máximo. Às vezes mando alguma matéria que saiu, eles olham, acham legal, mas nada demais.

iG: Como conciliou os estudos com as competições? Conseguiu terminar o ensino médio?
Adriano de Souza:
Não consegui. Parei no segundo ano, mas fui rastejando, tentando conciliar os eventos com a escola. Até que entrei no Circuito Mundial e não tinha mais como porque ficava 4 ou 5 meses fora de casa. Quando terminar tudo quero voltar. Pretendo fazer uma faculdade de informática porque sou bem ligado em internet. Sempre que vejo alguém que trabalha com isso pergunto tudo, sou bem curioso.

iG: Você foi rotulado aos 15 anos como a grande promessa do surfe nacional. Nunca se sentiu pressionado?
Adriano de Souza:
Tive algumas fases em que decaia e pensava: “Não era para eu estar aqui embaixo, sempre estive nas primeiras colocações”. Tive que dar uma acordada porque sempre fui bem desligado. Passei a estudar muito o surfe. Você tem que estudar bem o adversário, as ondas, o lugar que você vai. Tem um certo segredo nisso. Se você se encaixar nesse estudo as coisas fluem.

iG: Tem antidoping no surfe?
Adriano de Souza:
Hoje a gente tem zero. Deveria ter antidoping, mas não tem. E é claro que tem alguma coisa que a pessoa pode tomar para melhorar o desempenho dela. Existe de tudo no mundo.

iG: Ainda existe o preconceito de que todo surfista é maconheiro?
Adriano de Souza:
Kelly Slater nesses 15 anos ajudou a quebrar muito isso. Antigamente rolava. Costumo dizer que existe o “antes de Cristo”, mas que o “depois de Cristo” não aconteceu, porque o Kelly não saiu ainda.

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iG: Mas não irrita ser parado numa blitz só porque tem prancha em cima do carro?
Adriano de Souza:
Se você não tiver nada para quê ter medo? Independente dessa imagem, como sempre estou tranquilo, nem me preocupo. Se me parar parou. Nunca usei drogas. Nunca tive vontade.

iG: Mulher de surfista tem que ser perfeita?
Adriano de Souza:
Mais do que isso. Tem que aguentar a gente, viu? E sofrer porque não é nada simples. A gente fica muito tempo fora de casa, não dá para acompanhar sempre e a minha, em especial, tem a carreira dela. Então não dá para seguir a minha vida. Estou com a Patrícia há um ano. Ela mora no Brasil e é modelo. Ainda tive sorte de achar uma namorada que ainda por cima é modelo! (risos)

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